O que é ter vaidade? É orgulhar-se da sua estampa… Uma pessoa vaidosa é aquela que se orgulha da sua estampa, se sente bem com ela.
A partir daí a primeira coisa que temos que deixar bem claro: vaidade não tem nada a ver com padrões de beleza. Vocês acham que apenas quem se arruma bem é vaidoso, mas aquele que tem orgulho de ser desarrumado é vaidoso. Ou seja, ele pode até ser desleixado, dentro dos padrões humanos, mas é vaidoso porque tem orgulho da sua estampa.
Este é o primeiro detalhe que temos que perceber quando a mente cria a idéia de estar vaidoso. Vaidade não depende de uma determinada roupa, limpeza ou de um determinado cheiro. Vaidade é uma formação mental, um pensamento, que reflete o orgulho da sua própria estampa.
Portanto, não adianta quebrar paradigmas andando de chinelo de dedo e calça e camisa rasgadas para mostrar que não é vaidoso, pois é. É orgulhoso da sua calça e camisa rasgada, do seu chinelo.
Precisamos ter cuidado com este detalhe porque a mente cria padrões de certo e quando nos orgulhamos dos nossos certos, somos vaidosos. Para uns este padrão é a roupa limpa, nova, bem passada; para outros é a roupa arrebentada, rasgada, sem estar bem passada. Não importa o que seja, tudo é padrão. Tudo é o certo de ser usado.
Quando se fala em ter vaidade temos que ter muito cuidado porque só nos acostumamos julgar como vaidoso aquele que anda bem arrumado. Por isso aceitamos quando a mente nos diz que nós não somos vaidosos porque não andamos bem arrumados. Aí, quando a mente diz que é certo ser desarrumado e nós aceitamos isso, o que acontece? Nos tornamos vaidosos e nem sabemos…
Este é o primeiro grande detalhe que temos que ter em mente: a vaidade independe do nosso estado, da nossa estampa, mas é algo que se prende ao nosso conjunto de certo.
Libertar-se da vaidade não é usar chinelo de dedo, mas sim não aceitar o padrão de certo que a mente cria. Não aceitar que a mente crie que você só pode sair de casa com a camisa bem passada ou furada. Não aceitar quando a mente diz que aquela é a roupa adequada para onde você vai. Aceitando isso se transformará em vaidoso: ‘Eu estou vestido de acordo com o ambiente’…
Para realmente poder libertar-se da vaidade é preciso retirar a idéia de que vaidoso é quem se submete a um determinado padrão e entender que vaidoso é aquele que aceita o padrão certo que a mente cria.
Como libertar-se da vaidade? Não aceitando o padrão criado pela mente como certo, como obrigatório. ‘Não mente, não tenho que estar de chinelo de dedo. Se andar com ele, tudo bem, mas se não andar, também tudo bem. Eu não vou entrar na sua que tenho que estar de chinelo de dedo ou que tenho que estar com sapato de couro’…
Seguir os padrões de certo lhe prende ao sofrimento ou ao prazer. Isso porque eles levam ao pensamento do eu gosto, eu me sinto bem, isso é que é o certo de ser feito. É preciso ter atenção a todo esse conjunto de pensamentos que diz que vocês gostam ou se sentem bem, quando isso é apenas uma criação da mente. Vocês não se sentem bem. Aliás, nem a mente se sente: ela lhes dá a idéia de estar se sentindo assim. Nem ela nem vocês vivem emoções…
Portanto, é preciso que no aqui e agora reconheçam a mente usando um padrão de certo, de gosto, de estar de acordo, para não aceitá-los como certo, bonito ou de acordo. Para isso digam para a mente: ‘Eu estou assim, mas não sei se gosto ou está certo estar assim’…
Mas, há mais um detalhe no tema ter vaidade que precisamos abordar… Vamos a ele…
Na primeira análise que fizemos, descobrimos que o tema não é ter vaidade, mas estar vaidoso por estar seguindo o nosso padrão de certo, de bonito e do tem que ser assim. Para quem entra nessa, ou seja, aceita os padrões que a mente cria, sabe qual é o fim? Transformar-se em um julgador do próximo…
Quem aceita quando a mente diz que existe determinada roupa certa para se estar, vai aceitar quando ela julgar o outro. Vai achar o próximo errado, chulo, rebelde, que não presta…
Não tem como você sair do julgamento do próximo se ainda acreditar no padrão que a mente cria. Se você, por acreditar na mente, achar que existe uma roupa certa para se vestir, uma maquiagem certa para aquela ocasião, uma postura certa para se realizar determinada coisa, vai julgar todo mundo que não estiver dentro dele…
Aliás, não é só quem estiver fora dele que será julgado, mas quem estiver dentro também será julgado. Isso porque certo e errado são sentenças de um julgamento… São decisões tomadas depois de uma análise. Esta análise é um julgamento…
Sabe, vocês me falam muito nos ensinamentos de Cristo, dizem que devemos segui-los, mas ainda não entenderam que julgam todos o tempo inteiro. Isso porque qualquer opinião que se tenha sobre alguém ou alguma coisa é o veredicto de um julgamento.
Falam em cumprir o ensinamento de Cristo, mas ainda não entenderam que não há como escapar do julgamento sem eliminar os padrões de certo e errado, bonito e feio, limpo e sujo, arrumado e desarrumado… Enquanto vocês tiverem padrões para balizar a vida, irão julgar o próximo. O julgamento nesse caso, é decorrência natural da existência de um padrão…
Este tema foi muito importante para nós, não por ele mesmo, mas porque o sub-produto da vaidade é o julgar o próximo…
Quero aproveitar, ainda, para falar de um termo que usei aqui. Disse que a vaidade é o orgulho da estampa. Este termo (orgulho) não foi perfeitamente empregado. Na verdade o que o vaidoso tem é soberba…
A soberba existe quando você joga o seu orgulho sobre o outro, ou seja, se considera o certo, o melhor, o mais bem vestido, o que está fazendo determinada coisa como ela deve ser feita, aquele que realiza tudo…
O vaidoso é soberbo porque toda vaidade acaba num julgamento. Isso porque ele não se contenta em aceitar que está bem vestido, mas julga como os outros estão.
Portanto, a vaidade não é o orgulho da sua estampa, pois orgulho é outra coisa: é ter a sensação do dever cumprido. Já soberba é ter a sensação do dever cumprido e dizer que o outro não cumpriu o dele ou dizer que você fez melhor do que ele… Vaidade, então, é ter soberba…
Não existe vaidoso que não seja soberbo. Vaidoso humilde? Não existe… Andar de chinelo de dedo e blusa rasgada não é sinal de humildade não… Como já falei diversas vezes, tem muito pobre que come arroz com feijão e arrota caviar. Assim como tem muito rico que come caviar e arrota arroz e feijão…
Agora, tudo isso que estamos falando não é de você-observador: é criação da mente. O seu problema não é ser o que falei aqui, mas tornar-se tudo isso por compactuar com a mente.
Como já tinha dito, quando se apega às verdades da mente, não existe moeda só com um lado: toda ela tem dois lados. Se você aceita o padrão de certo, não poderá escapar do julgamento.
Agora, quando compactua com isso, se é cristão, você acabou de ferir aquilo que diz que acredita… Para os cristãos, lembro ainda de mais um ensinamento de Cristo: não julgue para não ser julgado. Nesta máxima é que aparece o segundo sub-produto da vaidade…
Você, o observador, vamos dizer assim, já começou a rolar o precipício quando sentiu-se vaidoso. Desceu mais um pouco quando julgou o outro. Mas, acaba de cair quando reclama que o outro está lhe julgando. Ou seja, você tem o direito de julgá-lo, mas ele não tem o direito de fazer a mesma coisa com você?
Veja como uma coisa vai levando a outra. Isso é um fluxo mental que não para. Se você aceita o padrão de certo, vai aceitar a vaidade. Aceitando-a, vai aceitar também a soberba. Esta aceitação lhe levará a aceitação do julgamento. Aceitando-o, a aceitação da crítica a quem lhe julgou é inexorável…
Nesta vida tudo se encadeia, tudo se liga a outra coisa. Não dá para querer deixar de criticar o outro sem julgá-lo. Não para deixar de julgar, sem ter a soberba que está certo. Não para deixá-la sem libertar-se dos padrões de certo e errado.
Eu sempre disse: vocês precisam começar a mergulhar fundo no mar mental. Na verdade, no trabalho de cada um, vocês ainda estão navegando nas ondas, sobre o mar. Querem acabar com a vaidade, mas isso não se faz sem destruir os padrões de certo e errado. Querem deixar de criticar, mas isso é impossível se ainda houver a soberba (eu estou certo)…
Ninguém esvazia uma piscina estando no meio dela. É preciso descer até o fundo dela para puxar a rolha. Neste caso, a rolha é os padrões: certo, bonito, limpo, arrumado, saúde, doença, correto… É aquelas coisas que a mente têm como reais, mas que são verdades relativas: só servem para você mesmo.
Se você não for a fundo, não tirará a rolha. Se não fizer isso, não há como esvaziar a piscina. E não há como retirá-la estando na superfície ou no meio da piscina…
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Oh my God!