Participante: o observar a mente que você propõe é parecido com a sua incorporação? O médium está inconsciente, mas está observando o que você fala. Nós também estamos inconscientes e tudo o que você ensina tem por finalidade nos tornar observadores conscientes da mente para depois nos tornamos conscientes de nós mesmos?
Sua pergunta está um pouco complicada, mas acho que deu para entender o que quis dizer. Vou tentar responde-la.
Primeiro parte deste trabalho e que é de suma importância para quem pretende ser feliz: separar o observador da mente.
O que é a mente? São os pensamentos que surgem espontaneamente em você. São aquelas ideias que surgem sem que você tenha criado, sem que tenha noção de onde ou porque vieram. Quando mentalmente você discute consigo mesmo se vai a um lugar ou não ou se vai tomar esta ou aquela decisão, isso não é mente. Isso é você. Quando você está sem pensar em ir a lugar algum e lhe vem a ideia que quer ir a um determinado lugar ou se esqueceu de algum compromisso, isso é mente.
Normalmente tudo o que é mente é impessoal. Tudo que é você, é eu: ‘eu sou, eu faço, eu vivo, eu tenho’.
Este é o primeiro aspecto que aquele que quer seguir este caminho precisa estar consciente, porque só tendo esta consciência você consegue separar o observador da mente. O observador é aquele que usa a mente para conversar consigo mesmo. Sobre o que ele conversa? Sobre a mente, sobre a vida.
Agora um detalhe: o observador não está inconsciente. Na verdade, ele está iludido pela mente. Por que? Porque ele acha que a mente é ele ou que ela é o resultado de uma ação dele. Imagina que é ele que pensa. Por isso, quando a mente fala através dos pensamentos, o ser humano não separa o que é mente e que o é ele.
No exemplo que dei, quando surge na sua cabeça a ideia de ir a algum lugar, como disse antes, é a mente que está falando. Só que o observador não atento, o adormecido, vai achar que ele se lembrou de ir a tal lugar, que ele teve vontade de ir. Só que isso nada tem a ver com ele; foi algo que surgiu na sua cabeça.
Esse é um grande detalhe que você precisa se atentar. Não confunda de maneira alguma o que estou falando com incorporação, pois esta atividade é outra coisa completamente diferente. É algo que vocês não sabem, não entendem nem conseguem sequer conceber o que está ocorrendo.
Algumas vezes me perguntaram sobre incorporação. Nunca me neguei em explicar este assunto. Só que quando eu explicava, as pessoas ficavam me olhando com cara de bobo. Por que? Porque por mais que eu explique, não dá para vocês compreenderem esta questão.
Acho que respondi a sua questão, mas há algo mais que gostaria de acrescentar na questão observador e mente. Mais do que tentar definir o que o observador e a mente fazem, você precisa ter a consciência de que jamais conseguirá saber na realidade quem é o observador.
Sei que vocês, guiados por suas mentes, estão ansiosos em tentar saber quem é o observador, mas isso é impossível. Não podemos dizer que o observador é um eu, porque para vocês um ser, um eu, é um corpo. Vocês só se reconhecem quando veem o corpo. Também não podemos dizer que o observador é o espírito, porque como já conversamos, você não tem a menor condição de conhecer o que é o espírito.
Por isso, não tentem saber quem é o observador. Sobre esta questão, a única coisa que você pode saber, pela prática da vida, é que existe um observador e a mente que é observada. Mais: que quando a mente não é observada, o observado vira mente.
Participante: Quando o observador da mente observa, se abre o canal da intuição?
Intuição para ligar a quem, ao mundo espiritual? Mas, nós começamos este trabalho dizendo para vocês pararem de querer misturar coisas espirituais com materiais.
O que você chama de intuição é a sua mente funcionando. Tanto é assim, que intuição é algo que nem sempre dá certo. Pode dar ou não. Intuição é algo que surge na sua mente; você não cria.
Portanto, sempre que achar que recebeu uma intuição, trabalhe imaginando que aquilo foi a mente que falou e aja conforme conversamos. Observe o que a mente fala através da intuição e não compactue com aquela ideia.
Participante: O observador observa tudo e não pode ser observado?
Para que o observador seja observado, deveria haver um observador do observador. Essa pessoa já seria outro que não você. Portanto, esqueça a sua pergunta.
Se conseguir observar a sua mente, já está indo longe no trabalho. Você não precisa que essa sua dúvida seja resolvida para poder fazer alguma coisa.
Participante: Nos diga como observar a mente?
Observando. Vendo onde ela quer lhe levar, vendo o que ela quer fazer com você, vendo o que ela quer lhe dizer.
O que a sua mente está lhe dizendo neste momento à respeito do que está ouvindo, você sabe? Não. O que imagina é que você está tendo essa compreensão. Isso não é real. A compreensão que imagina que você está tendo, está sendo lhe dada pela sua mente.
Ouça a mente. Ouça o que ela está lhe dizendo, ou seja, tendo consciência de que o que está pensando é ela que está falando e não você que sabe, acha ou gosta.
Ouça a mente, ao invés de pensar.
Participante: Somos ao mesmo tempo o observador e a coisa observada?
Não. Você não é a coisa observada. Só se torna isso quando não observa a coisa.
Um exemplo? A mente hoje está lhe dizendo que está calor, que está quente. Você só se torna quente, com calor, porque não observou a mente. Tornou-se a coisa observada, porque não observou a coisa.
Participante: E quando eu observo, me torno o que?
O observador.
Enquanto não observa, não posso dizer que é o observador, pois você se mistura com a coisa observada.
Participante: Quer dizer que se eu observar a mente não vou sentir calor?
Claro que continuará tendo. O calor estará no seu corpo. O que você não terá mais é o desespero que vive hoje quando a mente diz que está calor: ‘ai meu Deus, como está quente. Que coisa horrível. Como alguém pode viver assim’?
Sabe quem pode viver assim? Você, ou será que por causa do calor você morreu?
Participante: Então, eu preciso observar-me no ato da ação para ver o que eu estou sentindo. Por exemplo: se estou tendo a gula, avareza, raiva, etc.?
Não. Não estou falando em observar-se, mas em observar a mente.
Sim, você precisa observar a mente para ver o que ela está sentindo.
Saiba de uma coisa: você não tem gula. Quem tem gula é a mente. Você só passa a ter gula quando aceita, por não estar observando mente, a que é criada no seu mundo mental. Quando não está observando a mente, você transforma-se nela e por isso vive o que ela cria.
Você não tem raiva: quem tem é a mente. Quando a mente cria a raiva, se você estiver desperta, não precisará sentir-se raivosa. Poderá viver a raiva com felicidade.
Como já disse, a felicidade é um estado de espírito com o qual você vive o sentimento que a mente cria. Por isso, você pode viver a raiva, a decepção ou qualquer outra emoção que lhe seja mostrado pela mente em felicidade. Basta, para isso, não se identificar com ela.
Participante: Estar atento a observar é racionaliza sobre o que está acontecendo? Muitas vezes costumo racionalizar minhas emoções ou seja, sinto algo, tenho vontade de reagir a este sentimento e racionalizo: ‘esteja aqui e agora; veja do que se trata’; ‘observe’; ‘não seja levada’.
O grande barato da busca da felicidade é que você precisa controlar a mente, mas só tem a mente para combate-la, ou seja, só tem o que você chamou de racional. Não dá para se vencer a razão a não ser através da razão.
Então, à priori, sim, você tem que ser racional. Mas, não tem que racionalizar o que está acontecendo. Tem que racionalizar o que a razão lhe diz que está acontecendo.
‘Ah, Joaquim, é a mesma coisa’, você me diria. Eu respondo: não, não é.
Estou dizendo isso porque se você observar uma pessoa sentada numa cadeira, vai querer mudar a sua forma de sentar, vai se prender ao que está vendo, ou vai querer se libertar dessas coisas. Isso é o que acontece quando se racionaliza o que está vendo. Agora, quando passa a observar a mente, racionaliza o que ela está dizendo, pode se libertar do raciocínio que ela faz. Liberta-se da mente e não do que ela está criando.
Essa é a diferença. Não queira racionalizar dento do eu, do individual, dentro do acordado. Não queira racionaliza o que está acontecendo, mas racionalize o pensamento, pois aí a sua ação é em cima do pensamento e não em cima do que está acontecendo externamente.
Participante: O senhor quer dizer que tudo vai passando, inclusive aquilo que chamo de eu? Só o que fica é o observador?
O observador é sempre o mesmo. O resto vai sendo alterado ao longo da vida. Isso porque todo o resto é mente.
Participante: Estou fazendo algo pensando em outro. A observação é no que estou pensando ou no que estou fazendo?
Você acabou de compactuar com a mente. Onde? No ‘eu estou fazendo’. Você não faz: observa o que é feito.
Na verdade, quem está fazendo alguma coisa para outro? A mão, o pé, a perna, etc. Estes membros não são você. A mão nem é o José, a personalidade que você imagina ser. Você nem é o José que usa uma mão para fazer uma coisa.
Portanto, não deve prestar atenção ao que é feito. Deve, sim, prestar atenção ao que a mente está lhe dizendo que está fazendo.
Você, quando imagina que há algo sendo feito, está no mundo da presunção, das probabilidades. Você não faz: observa o que é feito.
Participante: Poderia me explicar melhor que é o observador?
Se eu lhe explicar, quem vai entender: você ou a mente? Sendo ela, se você entender, continuará preso a ela.
Não há como saber quem é você. A única forma de saber quem é você é aceitando o que a mente diz que é.
Participante: Observar a mente vira hábito? Este hábito nos torna indiferentes à mente ou ela se cala definitivamente?
A questão do hábito vamos analisar de uma próxima vez. O hábito é algo perigoso e precisamos falar dele com calma.
Participante: Estar observando, portanto, é uma ideia?
Sim, pode se transformar na ideia de estar observando. Quando? Quando você acha que está observando. Quando a mente lhe disser que está observando, observe isso, não aceite simplesmente isso.
É o que acabei de falar: o hábito é perigoso. Você pode se habituar a observar ser fazer determinada coisa e aí para de observar de outras formas. Nesse momento, a mente diz que você está observando e lhe pega.
Portanto, não, é preciso observar tudo o que a mente cria.
Participante: Quando a ideia de não estar fazendo algo surge, também é para observarmos esse não fazer ficando em paz?
Sim. É o que já disse. Você tem que observar quando a mente lhe diz que está observando.
Por que? Por causa da questão do hábito. Habituar-se é ter o hábito de fazer sempre a mesma coisa. É começar a viver no piloto automático. O hábito é algo que se faz habitualmente e o trabalho de observar não pode ser feito automaticamente. Tem que ser realizado a cada momento.
Com essa resposta, acabo com a ilusão que vão conseguir transformar em automático o não se identificar com a mente e não vão ter mais que observar nada.
Participante: Quando, então, eu vou descansar?
Nunca.
Participante: Quer dizer que se eu entrar no automático, então a mente domina o observador e este vai perder a observação? Isso porque a mente dominou através do hábito?
Não, ele não vai perder a observação. Ele vai achar que está observando o que a mente está dizendo que ele está observando.
Quando se entra no automático, já não existe um observação. É a mente que está dizendo que há uma observação. Como você está no automático, você cai.
A mente lhe diz: ‘viu, eu observei. Olhe só que pergunta muito chata’. Como está no hábito, como está no piloto automático, vai acreditar nesta informação que a mente fala e dizer que isso foi fruto da sua observação. Mas, não foi: foi algo criado pela mente.
Participante: Como sair do hábito?
A mente diz que você está consciente de que está observando-a. Pergunte-se: ‘será que estou mesmo’?
Nunca compactue com o que lhe vem à mente. Para que você realmente esteja observando só existem três respostas: não sei, dane-se, e daí.