O Livro dos Espíritos – Pergunta 266
“A doutrina da liberdade que temos de escolher as nossas existências e as provas que devamos sofrer deixa de parecer singular, desde que se atenda a que os Espíritos, uma vez desprendidos da matéria apreciam as coisas de modo diverso da nossa maneira de apreciá-los”.


Neste trecho podemos ver a fé de Kardec em ação: “a doutrina da liberdade que temos de escolher as nossas existências e as provas que devamos sofrer”. Toda a fé de Kardec existia por conta da compreensão de que a vida humana de cada ser nada mais é do a expressão da escolha que o espírito faz antes de nascer.
Como todo ser humano daquela época, Kardec não conhecia isso, não possuía este conhecimento. No entanto, quando dos seus estudos juntos ao mundo espiritual recebeu a informação do Espírito da Verdade em resposta a pergunta se o espírito sabia antes de começar uma nova existência corporal o que lhe sucederia no curso da vida terrena (“ele próprio escolhe o gênero de suas provas”) não discutiu. Ao invés de contestar esta informação, continuou questionando o Espírito da Verdade – as demais perguntas do subcapítulo “Escolha das Provas” que está no Capítulo VI do 2º Livro de O Livro dos Espíritos – sem duvidar do que tinha recebido, mas buscando compreender perfeitamente o que fora ensinado naquele momento. Com isso formou a sua fé, a crença que lhe servia como base para entregar-se ao Pai: a vida humana é uma dramatização que se fundamenta nas escolhas das provas antes da encarnação.
Para alcançar esta fé ele teve que atentar a algo: os espíritos “desprendidos da matéria apreciam as coisas de modo diverso da nossa maneira de apreciá-los”. Aí está o fundamento da fé espírita ou espiritualista, ou seja, aquilo que deve ser vir de base para a entrega com confiança em Deus: a certeza que o espírito escolhe o que vai lhe suceder durante a encarnação e que age assim motivado pelo pela certeza de que com isso receberá algo depois do desencarne. Analisando isso à luz do que os humanos acreditam, descobriu que a forma espiritual de pensar é diferente da do espírito liberto da ação da humanidade.
Foi a partir desta convicção que Kardec passou a raciocinar a vida e deve ser a partir dela também que vocês devem raciocinar os acontecimentos das existências de vocês. Os espíritas e espiritualistas, portanto, devem compreender os acontecimentos da sua existência a partir da ideia de que eles são fruto de uma escolha deles mesmos quando libertos da ação da matéria e que tal escolha agora não pode ser compreendida porque os move outro anseio. Compreendendo isso, pode então, compreender que o lado penoso que vê nas provações não existe, mas que são apenas fruto da sua forma de ver o mundo.
Esta fé é raciocinada e não aceita simplesmente. É raciocinada porque a crença que a fundamenta é gerada uma razão, uma lógica. Só que esta não é mais formada pelos conhecimentos humanos, mas por aquilo que foi ditado pelo Espírito da Verdade.
Vivendo o que acabamos de dizer, o ser humanizado compreende, então que é possível se viver esta vida com a felicidade que o espírito vive: basta para isso compreender que tudo que lhe sucede foi resultado da sua escolha antes da encarnação. Mais: que foi escolhido isso porque quando liberto das influências carnais sabia que aquele acontecimento era o melhor para a sua existência eterna. Esta é a base da fé, da entrega a Deus com confiança, daqueles que dizem acreditar no espírito e na oportunidade da encarnação.
Este é o raciocínio da fé proposto por Kardec e não o julgamento do que é dito ou a interpretação do que foi ensinado apegado à ilusão criada pela influência carnal que agora vivencia.