O Livro dos Espíritos – Pergunta 0073
O instinto independe da inteligência? Precisamente, não, por isso que o instinto é uma espécie de inteligência. É uma inteligência sem raciocínio. Por ele é que todos os seres proveem às suas necessidades.
O raciocínio é um processo de escolha entre diversas opções. O espírito percebe alguma coisa, ou seja, vê, cheira, prova sabor, ouve sons ou percebe alguma coisa pelas sensações do corpo e promove um raciocínio.
Raciocínio quer dizer analisar uma massa de percepções e chegar à uma conclusão, uma verdade, uma realidade: é isso que o ser racional faz… Mas, analisá-la à luz do que? Das verdades embutidas na sua própria memória e da sua projeção futura, imaginação.
Depois da análise, o ser racional chega a uma conclusão que, para ele, é verdade e realidade. Mas, veja, toda a memória é formada por verdades individuais, ou seja, o que cada um acha, imagina saber. Portanto, o resultado da conclusão será sempre fundamentado naquilo que ele sabe: será uma verdade relativa, uma realidade individual.
Já no instinto, o espírito recebe a mesma massa de percepções (visão, audição, olfato, paladar e sensibilidades do corpo) e vai, a partir deste conjunto, buscar na memória um comando que determinará o que ele fará. O espírito instintivo não buscará na memória elementos para poder analisar as percepções, mas simplesmente comandos pré-escritos que dirão o que deve ser feito. Vamos ver isso na prática?
O espírito que comanda uma forma animal (que age por instinto), percebe o estômago vazio… Ele vai automaticamente buscar o alimento. Como o ser humano – o espírito que vive o processo racional – age?
Ele percebe o estômago vazio e buscará na memória o que está relacionado a isso e encontra lá a sensação de fome e o desejo de alimentar-se, tal qual o instintivo. Mas, será que ele agirá da mesma forma? Não…
Antes ele vai olhar o relógio para ver se está na hora de comer – porque comer fora da hora engorda ou faz mal à saúde, não é mesmo? Se a nova percepção (a hora) não for analisada como correta para alimentar-se, o espírito não o fará.
No ser racional sempre haverá sempre a busca de razões, de satisfação de padrões. Se não estiver preocupado com a hora pode estar preocupado se é bom para a saúde alimentar-se naquela hora, se esta atitude não vai afetar o regime ou a dieta que está fazendo…
Chegando à conclusão que deve comer naquela hora, qual será a próxima preocupação? Com que alimentar: se aquilo é bom de se comer, se ele está com vontade deste alimento… O ser racional só pratica o ato depois de analisar diversas vezes a sua atitude e considerar que está “certo” fazer aquilo…
Essa é a diferença entre o instinto e o raciocínio: o instinto segue um comando sem questioná-lo; a razão necessita de padrões e separa o “certo” do “errado”… Por isso se diz na Bíblia que o homem, a encarnação do espírito, nasceu do desejo do ser universal de querer conhecer o “certo” e o “errado” das coisas.
Nota: Esta citação alude a história da conversa de Eva com a cobra que está no livro bíblico Gênesis, capítulo 3.
O espírito cuja inteligência funciona através do processo racional faz uma análise da percepção e toma uma decisão fundamentada nos seus conceitos de “certos” e “errados”. Mas, como já vimos no último texto, estes conceitos são diferentes entre todos os seres porque constituem a individualidade de cada um. No instinto isso não acontece: o espírito percebe e busca o que já está programado como reação àquela percepção e age, sem se preocupar em satisfazer padrões.
Esta é a diferença entre uma coisa e outra, pois, no fundo, todos os dois são processos da inteligência. Isto porque, na verdade a inteligência é apenas a capacidade de perceber e armazenar informações. Tanto a questão de buscar a ordem direta ou de analisar as percepções, são apenas processos utilizados pela inteligência entre o perceber e o armazenamento das informações recebidas.