19. Aquele que não se comove com o louvor fácil e com a áspera censura, que é silencioso e desapegado, que está contente com tudo, que não está comprometido por um lar, que possui uma firmeza mental, esse que assim Me ama, esse é Meu amado. (Bhagavad Gita-Capítulo XII)
Tem uma frase interessante nesse ensinamento que, aliás, está presente nas transmissões de todos os mestres. Já estudamos esse assunto em outras mensagens, mas em Krishna é a primeira vez que esse assunto é tocado: ‘aquele que não está comprometido com um lar’.
Todos os mestres ensinam aos seres humanizados a não se comprometerem com um lar. Cristo, Buda, Espírito da Verdade falaram sobre isso. Krishna também. Aliás, tem uma história no Bhagavata Puranas onde o Sublime Senhor conta o seguinte.
Um passarinho encontrou uma passarinha e ficou perdidamente apaixonado. Fazia tudo por ela até que um dia tiveram um lindo passarinho. O filhote vivia voando pela mata cantando. Um dia, o filho caiu na rede de um caçador. A mãe desesperada por causa disso foi tentar salvá-lo. Também ficou presa à rede. Nesse momento, o pai perdeu toda a sua alegria de viver.
A prisão àquilo que chamam de família é a sentença de morte para a felicidade do ser. Cisto ensinou isso, Buda também. O próprio Espírito da Verdade também ensinou a mesma coisa. Agora vem Krishna e nos alerta sobre a mesma questão.
Apesar dessa unicidade, quando repito o que disseram dizem que sou insensível. Quando ensino que para seguir Cristo e chegar a Deus é preciso abandonar pai e mãe, dizem que não sou amoroso. Mas, o próprio mestre nazareno ensinou isso.
O laço familiar só existe nesse mundo. No universo não existem diversas famílias. Há apenas uma: a família de Deus.
Quando vocês separam a família de Deus em pedacinhos e se prendem a um defendendo-o dos outros, estão mortos. Falo assim, porque estão querendo dividir o indivisível. Assim não conseguem ver a emanação de Deus através das pessoas, objetos e acontecimentos desse mundo.
Essa informação completou todos os ensinamentos que poderíamos retirar do Bhagavad Gita. Se como foi dito até aqui é preciso que o ser humanizado liberte-se de tudo o que é material, não podemos manter nada que pertença apenas a este mundo.
Como ensinou Krishna nos versículos anteriores que estudamos, tudo só é sagrado quando encarado como emanação de Deus. Apesar desse aviso, o ser humanizado ainda separa parte das coisas do mundo material para tornar sagrado.
Isso é ilusão. Dessa forma nada é sagrado, pois quando se consagra apenas alguma coisa, transforma-se outras em diabólicas.
A liberdade que o espírito alcança quando se desliga das coisas materiais é suprema. Ele se torna livre de tudo que é material, de toda e qualquer amar que prenda a essa vida, a esse mundo. Tudo que o ligue às leis deste mundo ou a qualquer elemento do sistema humano de vida.
O verdadeiro sábio é completamente só. Isso não quer dizer que precise ser solteiro. Não, pode até ser casado, mas está liberto da amarra da família.
Ele não vive em devoção ao marido, esposa ou filhos, mas em devoção a Deus. Vê Deus através do cônjuge e não o ser humano.
Participante: precisamos ver Deus em todas as coisas.
Perfeito, mas você não vê a manifestação de Deus através dos outros quando agridem a sua família. Não vê porque está preso àquela família.
Não estou falando aqui, assim como os mestres também não falaram, que não devem casar. O que estou dizendo é que devem se casar com Deus, mesmo que vivam familiarmente com outros seres. Quando fizerem isso vão conseguir ver no outro a emanação de Deus e não o homem ou mulher da sua vida.
Quem vive com os seres criados pelo ego, não vive com Deus. Por conta dessa vivência é que os seres humanizados sentem-se às vezes feridos ou magoados por alguém. Se estivessem em conexão com Deus, como poderiam imaginar que o Pai possa ferir ou magoar alguém?
É isso que Krishna está nos ensinando e que todos os mestres também ensinaram. Quando Cristo nos diz que se deve abandonar pai e mãe para segui-lo, fala em abandonar a figura do pai e a da mãe para poder se conviver com o ser humanizado que está exercendo aquele papel como sendo emanação de Deus
É por conta da dificuldade em conviver com o parceiro como uma emanação de Deus que Paulo ensina: o melhor era não se casarem. Mas, para poder conter um pouco o seu individualismo, case. No entanto, ao casar, saiba que não está se unindo a ninguém: continua unido a Deus.
Cada um tem uma vivência própria para viver. Quando se devota ao outro, deixa de viver a sua vida.
Portanto, você não precisa deixar de criar uma família, mas conviva com ela sem amarras. Conviva sem a obrigação que cada membro dela satisfaça o outro.
Numa família cada membro não pode exigir que o outro satisfaça seus desejos. Para comungar com Deus precisa trabalhar a si para sentir-se amado pelo Pai, pouco importando o que o outro esteja fazendo.
Essa é a diferença entre a vivência do casamento como hoje acontece no planeta e o que é entendido como casamento pela espiritualidade. Hoje vivem uma comunhão onde se busca a satisfação e a idolatria a si no outro.
Já comentamos a resposta que Cristo dá aos fariseus quando eles perguntam sobre a mulher que ficou viúva de sete irmãos: no céu não existe casamento. Como, então, podem considerar o casamento algo sagrado?
Apesar disso, a igreja cria uma santidade para o casamento. Paulo também não torna sagrado o casamento, mas a igreja, que é apostólica, fundamentada nos ensinamentos dos apóstolos, diz que a união matrimonial é santa e que não pode ser desfeita. Como pode esperar um compromisso que dure uma existência inteira se Cristo ensinou que não se deve jurar por nada, que não se deve comprometer com coisa alguma?
A formação do núcleo familiar que vocês vivem hoje é totalmente material. Tanto assim que o casamento é sacramentado com a assinatura de um contrato. Ao fazer essa negociação humana, você se sente aprisionado àquela união.
Saiba de uma coisa: para aquele que busca a verdadeira devoção a Deus, a vida precisa ser vivenciada nos detalhes e não no atacado. É preciso estar atento a cada detalhe para poder se libertar da ação do ego e com isso conseguir vivenciar a devoção que o aproxima de Deus. Por isso, afirmo que de nada adianta se libertar de muitas coisas, mas ainda manter-se preso ao núcleo familiar que vive.
Apenas volto a repetir: não estou falando em se separar, mas em aprender a viver com os membros desse núcleo dentro da verdadeira devoção a Deus. É preciso romper a dependência dos membros com a qual você vive a vida.