Participante: considerando que a obrigação de um emprego é julgar a ação dos outros o tempo todo, como conciliar a mente julgando como obrigação o observador não a acreditar nos objetivos?

Para responder, vou contar uma pegadinha da vida.

Começamos a estudar nos ensinamentos de Buda que não se devia ter conceitos que levassem o ser humanizado a julgar os outros. Enquanto fazíamos isso uma pessoa que frequentava esses estudos foi chamada para ser jurada no júri popular.

Ela ficou sem saber o que fazer, pois de nós ouvia que não deveria julgar ninguém, mas no dia seguinte era obrigada a sentar-se num júri e julgar pessoas. Me perguntava se devia pedir dispensa da função e eu disse que não. Afirmei que se foi chamada deveria se apresentar e exercer o que era esperado dela.

Isso intrigava essa pessoa, pois genericamente eu dizia que não se devia julgar, mas no caso particular dela insistia para que fosse julgar. A minha postura deveu-se a compreensão de que nenhum ser humanizado age: quem faz isso é a mente.

O ser humanizado não julga; quem faz isso é a mente. Por isso, pouco importa se a personalidade humana está julgando ou não. Ao ser humanizado, se quer ser feliz, compete observar a mente julgando e não julgar nada.

Para isso precisa dizer a si mesmo enquanto os pensamentos de julgamento são criados: ‘a mente está dizendo que essa deve ser a forma como julgar aquela pessoa. Louvado seja Deus e que ela julgue, mas eu não compactuo com o que está sendo criado’.

Observar a mente não é criar nela valores diferentes que lá existem. O que precisa ser feito é a observação dos valores que surgem e eximir-se de compactuar com eles.

Respondendo, então, digo que se o seu emprego é composto pela ação de julgar, deixe a mente fazê-lo. Ao mesmo tempo, faça o seu verdadeiro trabalho: observe o que é criado pelo pensamento e não se deixe levar por isso. Não acredite que a criação racional é uma verdade absoluta.

Mesmo imaginando que o seu trabalho é julgar, não acredite no julgamento feito pela mente. Saiba que esse é o emprego da sua mente, mas que o seu trabalho nessa vida se constitui em observar a criação mente e não compactuar com ela.

Vou dar um exemplo para melhor entendermos o que quero dizer. Digamos que seu emprego se consiste em entrevistar e escolher pessoas que serão contratadas pela empresa. Deixe a mente analisar os currículos e escolher o que for mais adequado para a empresa. Ela pode fazer isso, porque é a geradora da vida. Já você, que apenas vive a vida que é apresentada, exima-se de compartilhar da opinião dela. Diga apenas: ‘a mente escolheu essa pessoa, mas eu não sei se ela é a melhor ou não’.

O julgamento que você faz deve ser feito, porque esse é o seu emprego, é o trabalho material do qual depende para viver. Por isso, é preciso que aja essa ação. Só que não se misture com a ação. Deixe a mente realizar as suas escolhas em paz.

Enquanto ela trabalha, exerça o seu trabalho: observe a mente julgando.

Participante: isso também vale para o caso de fechar um grande contrato, por exemplo? Você está negociando com uma pessoa, vendo várias possibilidades e buscando realizar aquela operação. Neste caso devo também ficar apenas observando?

Fica muito difícil acreditar que deve apenas observar enquanto não cair na realidade, na real.

Por exemplo: você diz que está negociando com uma pessoa. Acredita que essa é a realidade que está vivendo, mas não é. É a mente que negocia e não você.

Você, naquele momento, está em algum lugar fazendo não sei o que. Quem está existindo naquele momento é apenas a sua mente.

Por isso estou dizendo que dificilmente compreenderá o que estou falando, pois não está na real, na realidade. Por mais que acredite que é você que está negociando, avaliando possibilidades ou realizando operações, quem está fazendo tudo isso é a mente.

Toda ação é praticada pela mente e não por você. A sua ação é, no momento que ela está agindo, observar o que é criado e optar em viver o que ela cria ou não.

Por esse motivo, quando a ação de negociar, buscar possibilidades e realizar operações estiver ocorrendo, deixe a mente negociar em paz. Ao invés de querer se intrometer no que ela negocia, esteja apenas atento para não deixar que qualquer coisa se transforme em verdade. Se isso acontecer, futuramente essa criação será usada para condicionar a sua felicidade.

O que falo em não se intrometer é não ter certeza de que o que a mente está prometendo na negociação é verdadeiro ou não, se a promessa será honrada ou não, se a mercadoria será entregue no dia aprazado ou não. Tenha essa conversa consigo e deixe a mente negociar à vontade.